Luciano Borges dos Anjos

terça-feira, 20 de março de 2012

Opinião

DECÁLOGO CARIOCA

Por Erivaldo Brito

EU TINHA UM AMIGO CARIOCA chamado Fernando,quando eu era diretor comercial e de programação da Rádio Boas Novas, que gostava de dizer como eles eram “sintonizados com os baianos, até na birra com os paulistas”. Ele citava exemplos de como tudo que é baiano ou vindo da Bahia fazia imediato sucesso no Rio, que Getúlio Vargas costuma dizer que era o Tambor do Brasil, ou seja, bate-se aqui para ressoar em todo o país.
E o meu amigo citava em sua robusta argumentação os livros de Jorge Amado, as novelas de Dias Gomes, as canções de Caymmi, Gil e Caetano, as cantoras Ivete Sangalo, Bethânia, Margareth Menezes, Gal Costa, Daniela Mercury e outros menos votados.
Ao falar do carnaval, segundo as suas palavras “o maior espetáculo da terra”,todos os blocos que desfilam no Sambódromo, possuem uma Ala das Baianas, item obrigatório na classificação e pontuação final.
Certa feita ele me disse brincando que, ”tudo seria perfeito se uma placa tectônica afastasse para o Atlântico o Espírito Santo, transformando-o numa ilha, aproximando, assim, o Rio da Bahia”.
De tanto o meu amigo falar do assunto, comecei a prestar mais a atenção: Antonio e André Rebouças dão o nome a dois túneis dos mais importantes, também conhecidos como “Túnel Dois Irmãos”; a estátua de Teixeira de Freitas aparece imponente num pedestal ao lado do prédio da Ordem dos Advogados, e a de Ana Neri, no Hospital da Cruz Vermelha. É uma homenagem explícita aos filhos ilustres da Cachoeira e que, até o momento, não tiveram o reconhecimento nas mesmas proporções de seus conterrâneos.

Comecei a divagar sobre o assunto tentando entender o porquê de tal empatia e acabei retroagindo aos idos de 1808. Naquele ano, depois de uma estada de quarenta e cinco dias na Bahia, a Armada Real representada por oito naus, cinco fragatas, três brigues e trinta navios. conduziram toda a dinastia dos Braganças, parte da nobreza lusitana, do Clero e da Corte, sob a escolta de quatro navios de guerra britânicos que chegaram aqui no Rio no dia 8 de março, ou seja, depois de dois meses no mar. Uma considerável leva de africanos, baianos e cachoeiranos vieram juntos, inclusive o patriarca dos Rebouças, maragojipano que redigiu a histórica Ata de 25 de Junho de 1822, casado com uma cachoeirana.
Foram eles, - segundo o meu entendimento -, que se transformaram num fator preponderante para os cariocas atuais.
E para confrontar com os dias atuais, fiz uma decálogo das invencionices cariocas para que vocês vejam se não poderia ser coisa inventada na Bahia:

1) Tomar mate na praia.
2) Comer pizza (invenção italiana) com bastante catchup.
3) Tomar Coca Cola com bastante gelo (mesmo que esteja gelada) e bandas de limão.
4) Se ficar surpreso com alguma afirmação exclama “caraca”!

5) No ônibus ou no metrô, não querendo ceder o lugar destinado “aos idosos, gestantes e portadores de necessidades especiais”, finge que está dando o maior cochilo.
6) Até os mais cultos pronunciam “mermo” ao invés de mesmo.
7) Chamar o interlocutor de “meu querido”
8) Nas feiras livres, chamadas de “feira dos paraibas” rir sempre quando o feirante repete a mesma piada: “freguesa bonita não paga... também não leva!”.
9) Comemorar o aniversário em plena viagem no trem da Central, com direito a bolo com vela e o tradicional “parabéns” cantado desafinado.
10) Ao pedir um chope ou uma bebida quente qualquer, solicitar ao garçom ou balconista “um choro”.

E para encerrar, pra não perder o costume, vou contar um “causo”. Não sei por que cargas d’água nós baianos da Cachoeira, chamamos de “paulista” o que aqui é conhecido com “lagarto”. Então, certo dia, ao despedir-me de Fernando, disse na maior inocência e não sei como ele não morreu de um ataque de riso.

- Tô doido pra chegar em casa pra comer um “paulista”!


*Erivaldo Brito, advogado, escritor, cachoeirano radicado no Rio de Janeiro.